Convocado a prestar esclarecimentos ao Supremo Tribunal Federal sobre o bônus de final de ano, de R$ 10 mil, concedido a magistrados e servidores por meio do auxílio-alimentação, em dezembro passado, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) afirmou que o pagamento “é legal e cumpre a função de assegurar a cobertura das necessidades nutricionais diárias da pessoa humana”. O documento com as explicações foi encaminhado ao STF após determinação do ministro Cristiano Zanin Martins, relator de dois processos sobre o tema que tramitam no Supremo.
Com forte impacto negativo entre a população e repercussões no mundo jurídico de todo o país, o bônus — que passou a ser chamado de “vale-peru” —foi cancelado dias depois de ter sido pago, por ordem do Conselho Nacional de Justiça. A Corregedoria Nacional de Justiça abriu um procedimento administrativo para investigar o caso, mas, mesmo assim, o episódio passou a fazer parte de processos em curso no STF que pedem a avaliação da constitucionalidade deste tipo de benefício.
Além do processo ajuizado pelo presidente do Observatório Social de Mato Grosso, Pedro Daniel Valim, contestando o pagamento do auxílio, servidores do TJMT ingressaram com ação no STF para impedir o contrário, ou seja: que o auxílio seja devolvido.
Os desembargadores e juízes foram convocados a devolver o dinheiro nos dias seguintes à suspensão do bônus pelo CNJ, o que 13 deles não fizeram, alegando que tinham usado o recurso para resolver pendências financeiras. Esses 13 magistrados, entretanto, tiveram o valor descontado integralmente dos seus contracheques referentes ao pagamento de janeiro.
Mas para os servidores ficou estabelecido um parcelamento do valor por meio de descontos nos seus contracheques. O auxílio-alimentação pago pelo TJMT mensalmente é de perto de R$ 2 mil. Com o valor ampliado para R$10 mil exclusivamente em dezembro passado, eles tiveram um excedente de R$ 8 mil, que terá de ser devolvido. Ainda não se sabe o valor real do impacto dessa devolução de forma parcelada no orçamento do Judiciário do Mato Grosso.
No esclarecimento encaminhado ao STF, o presidente da Corte, desembargador José Zuquim Nogueira, resssaltou que “o objetivo da administração sempre foi garantir que o auxílio-alimentação cobrisse, de maneira digna, as despesas alimentares dos servidores e magistrados”. E que o valor consistiu num “ajuste pontual e razoável quando diluído ao longo de todos os meses do ano”.
“Limitações impostas pelo orçamento frequentemente inviabilizam a concessão de reajustes contínuos e permanentes. Diante desse contexto, conclui-se, de forma incontestável, pela estrita legalidade do pagamento idealizado por esta Corte, o qual teve como finalidade única assegurar o cumprimento integral da função a que se destina o auxílio-alimentação, sem destoar de valores praticados por outros tribunais estaduais brasileiros”, enfatizou o magistrado.
“De boa fé”
Na ação ajuizada pelos servidores por meio do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário de Mato Grosso (Sindjusmat), a entidade argumentou que “a responsabilidade pelo pagamento do auxílio ampliado cabe exclusivamente ao TJMT e que os funcionários não devem ser penalizados”. “O ônus pelo erro em questão é do Tribunal de Justiça e não pode ser repassado aos colaboradores”, acrescentou..
O sindicato também disse que “os servidores receberam os valores de boa-fé e que não podem ser compelidos a devolver quantias destinadas ao seu sustento”.
O TJMT, por sua vez, tem justificado desde o início que o aumento do auxílio consistiu num “benefício extraordinário para o período festivo” de final de ano e reiterado que não foi a primeira vez que foi concedido. Para o corregedor nacional de Justiça, ministro Mauro Campbell Marques, tal reajuste caracteriza “desconfiguração do auxílio-alimentação”. As investigações da corregedoria do CNJ sobre o caso prosseguem.